"PARECE
QUE CAMINHAMOS NAS NUVENS!"
“Parece que caminhamos nas nuvens,
sustentadas por esse amor”, confessou Agatha Christie ao nos contar sobre sua
primeira paixão por um rapaz.
De um modo ao mesmo tempo doce e divertido, nossa
Rainha do Crime nos brinda com estas deliciosas memórias de sua infância, extraídas de sua Autobiografia.
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Aos quatro anos de idade, apaixonei-me. Foi uma terrível, maravilhosa experiência. O objeto de minha paixão era um jovem oficial de Dartmouth, amigo de meu irmão. De olhos azuis e cabelos louros, atraía todos os meus instintos românticos. Ele não fazia a menor ideia das emoções que provocava.
Olimpicamente desinteressado da menininha
irmã de seu amigo Monty, provavelmente teria respondido, se lhe perguntassem a
esse respeito, que eu não gostava dele. O excesso de emoção fazia com que me
dirigisse para o lado oposto quando o via chegar e, quando sentada à mesa,
mantinha meu rosto resolutamente virado para outra direção. Minha mãe
repreendia-me gentilmente. “Sei que você é encabulada, queridinha, mas deve
procurar ser cortês. É tão mal-educada, virando o rosto a Philip o tempo todo e
apenas resmungando quando ele fala com você! Mesmo que não goste dele, tem que
ser polida!”
Não gostar dele! Quão pouco sabiam a meu
respeito! Quando hoje em dia penso nisso, revejo a felicidade que pode provocar
um amor infantil. É um amor sem exigências, que não reclama nada, nem uma
palavra sequer! É pura adoração. PARECE QUE CAMINHAMOS NAS NUVENS, SUSTENTADAS
POR ESSE AMOR, criando em nossas mentes ocasiões em que poderemos servir
heroicamente à pessoa adorada.
Por exemplo: tratá-lo se ele ficar com
peste. Salvá-lo de um incêndio. Servir-lhe de escudo a uma bala fatal. Qualquer
situação que, em qualquer história do nosso conhecimento, suscitasse nossa
imaginação.
Essas histórias imaginárias não terminam
bem. Nelas se morre queimado, baleado, ou se sucumbe à peste. O herói jamais
percebe o sacrifício supremo que se fez por ele. Eu ficava por vezes sentada na
nursery, brincando com Tony, com uma aparência
solene e severa, enquanto em minha mente fervilhavam, numa exaltação gloriosa,
fantasias extravagantes.
Os meses passaram. Philip foi promovido a
aspirante de marinha e deixou o Britannia.
Durante algum tempo, a imagem dele ainda
persistiu, mas já começava a definhar. O amor desvaneceu-se para reaparecer
três anos mais tarde, quando eu amava sem esperanças um capitão do exército, alto
e moreno, que cortejava minha irmã.
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