—
Não sei... ah, meu Deus, não sei como... O senhor não vê, é tão difícil. Eu...
eu mudei de ideia. Não leve a mal, mas... acho que vou embora.
—
Vamos. Coragem.
—
Pensei que pudesse chegar e. .. e lhe perguntar, perguntar o que devo fazer...
mas não posso... o senhor não percebe? É tão diferente do que eu pensava...
—
Diferente, como?
—
Por favor, desculpe, eu não quero ser grosseira, mas... Ela respirou com força,
olhou para Poirot, desviou o olhar, e por fim as palavras irromperam: — O
senhor é velho demais. Não me disseram que era tão velho. Não quero parecer mal
educada, mas é isso: O senhor é velho demais. Desculpe, por favor.
(A Terceira Moça)
* * * * * *
Pobre Poirot! Norma
Restarick desiste de contar-lhe uma coisa importante quando descobre que ele é
“muito velho”. Mas a idade de Poirot não tem sido um problema apenas para a
jovem Norma: ela tem intrigado há décadas os leitores e críticos, para não
falar na provável dor de cabeça que causou na própria Agatha Christie.
“Que erro terrível eu cometi ao criar Hercule Poirot
já tão velho.” – confessou
Agatha Christie na Autobiografia.
A questão é que a escritora
não contava que o detetive belga fôsse fazer tanto sucesso e,
consequentemente, perdurar ainda por tantos livros e por tantos anos. Para
piorar o dilema, ela o criou já como um policial aposentado, o que o envelheceu ainda
mais desde o início.
“Como resultado, meu detetive ficcional deve ter mais
de 100 anos hoje em dia!”
125 anos. Esta é a idade
aproximada de Poirot à época de sua última aventura, Cai o Pano, conforme concordam estudiosos e especialistas.
OS CABELOS TINGIDOS QUE COBREM AS CÉLULAS CINZENTAS
Manter uma lógica sobre
a idade de Poirot que seja realistica e matemática, como, aliás, ele próprio
apreciaria, ficou impossível. “Eu deveria
tê-lo abandonado após os primeiros três ou quatro livros e começado novamente
com alguém mais novo”, lamentou-se Agatha Christie.
Afinal, fazer com que a idade avançada do
detetive parecesse minimamente plausível diante dos fatos tornou-se um trabalho
desafiador, até mesmo para as famosas células cinzentas.
Mas Agatha Christie bem
que tentou. Um de seus truques foram os cabelos tingidos de Poirot:
O
cabelo do inspetor Spence estava todo grisalho agora; antes ele tinha apenas
alguns fios de cabelos brancos nas têmporas. (...)
— Já estou
velho agora — disse
Spence.
— Ambos
estamos.
— Não há
muito cabelo branco em sua cabeça — observou Spence.
— Resolvo
isso com um preparado — observou
Poirot.
— Não há necessidade de
se aparecer em público com cabelos brancos, a menos que se queira.
— Bem,
não creio que a pintura me assentaria — disse Spence.
(Noite das Bruxas)
(Noite das Bruxas)
Ao contrastar o
ex-policial Spence com Poirot, Agatha não deixa de mostrar a passagem do tempo – o policial
tinha só alguns fios brancos e agora estava todo grisalho – mas assegura que
Poirot tenha uma aparência mais jovem, ainda que através do recurso da tintura.
A FÓRMULA DA IDADE
Porém, seu melhor truque
foi manipular a passagem do tempo – sem muita lógica realística, infelizmente – especialmente
para fazer com que o detetive envelhecesse sim, mas, paulatinamente.
Sanders e Lovallo,
autores de The Agatha Christie Companion,
apontam para uma fórmula da idade nos
livros com Poirot: a relação de 3 para 2. Através desta fórmula seria possível determinar
a idade de Poirot, de modo que Poirot envelheceria aproximadamente 2 anos para
cada 3 anos do calendário.
A mim, essa explicação –
se é que pode-se chamá-la assim – parece bastante plausível.
Hum… eu disse plausível?
Que os anos passem cerca de 12 meses mais devagar para uma só pessoa? Não, ce n'est pas possible! - como diria o próprio Hercule.
A MAIOR DAS IRONIAS
Parece, afinal, que, por
grande ironia, justamente para aquele homem que preza a ordem, o método e a
lógica racional acima de tudo, sua idade e seu envelhecimento neste mundo
estejam cercados de ilogicidade e impossibilidades.
Hum, mas há uma solução
– e é matemática, como muito apreciaria Hercule Poirot!
Na parte 2 deste artigo,
falarei sobre os cálculos matemáticos que buscam definir com precisão a idade
do detetive. Aguardem, por favor!
Que bom que gostou do artigo, Adyla. Seja sempre muito bem-vinda à minha blogazine!
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