Dava
umas palmadinhas na cabeça ovoide, com absurda complacência, e observava, todo
satisfeito: “O verdadeiro trabalho é feito aqui dentro. As celulazinhas
cinzentas... lembre-se sempre das celulazinhas cinzentas, mon ami.”
(Poirot em Assassinato no Campo de Golfe)
David Suchet como Hercule Poirot |
As famosas células cinzentas de Hercule Poirot não funcionam
por si sós: elas necessitam de alimento para
operarem corretamente. Isto é, precisam de dados, de informações, de fatos com
os quais trabalharem.
Mas como Poirot obtém o combustível
para suas células cinzentas?
O esperto detetive usa de alguns recursos muito próprios para conseguir as informações de que precisa. Algumas das técnicas particulares de Poirot a fim de buscar os dados necessários para que suas células cinzentas possam operar e solucionar os mais intricados mistérios são:
O esperto detetive usa de alguns recursos muito próprios para conseguir as informações de que precisa. Algumas das técnicas particulares de Poirot a fim de buscar os dados necessários para que suas células cinzentas possam operar e solucionar os mais intricados mistérios são:
1- Para
despistar as pessoas:
A) Fingir
que ele próprio fala mal inglês
B) Fingir ser presunçoso
2- Para
obter informações das pessoas:
A) Contar
mentirinhas
B) Envolver
as pessoas para que falem naturalmente
Vamos a estas técnicas:
TÉCNICAS
DE POIROT PARA ALIMENTAR
SUAS CÉLULAS
CINZENTAS
1- Para
despistar as pessoas:
A) Fingir
que ele próprio fala mal inglês
Meu
amigo, falar o Inglês de modo estranho e sotaque é uma vantagem enorme. Isso
leva as pessoas a lhe desprezarem. Elas dirão: um estrangeiro - ele não conseguem
sequer falar Inglês corretamente. (Poirot em Tragédia em Três Atos)
Albert Finney como Hercule Poirot |
Até agora você pensava que Hercule Poirot fala com
todos aqueles maneirismos, com aquele sotaque e com todas aquelas palavras e
frases em francês simplesmente porque ele é assim mesmo? Ledo engano! Sim,
Poirot é belga, sim, ele tem sotaque, sim, sua língua mãe é o Francês. Mas
saibam que ele domina o idioma inglês muito mais do que deixa transparecer.
Na verdade, ele se aproveita de sua condição de
estrangeiro - e, consequentemente, do
preconceito que os ingleses teriam contra os estrangeiros – como uma técnica para
dar a impressão de ser apenas um tolo, alguém que não se pode levar muito a
sério. Com isso, as pessoas relaxam, não lhe dão muita importância, e acabam se
descuidando e revelando preciosas informações, as quais servirão de combustível
para suas células cinzentas.
Tal conclusão precipitada das pessoas em relação ao
seu aspecto estrangeiro fica bem clara nas palavras do Dr. Giles Reilly em Morte na Mesopotâmia, quando descreve
sua estranheza a primeira vez que avista Poirot:
Creio que
jamais esquecerei minha primeira visão de Hercule Poirot. (...) Para começar,
foi um choque, e acho que todos os outros devem ter sentido a mesma coisa!
(...) Sabia, naturalmente, que era estrangeiro mas não esperava que fosse tanto
assim, se é que me faço entender.
Ao vê-lo,
dava vontade de rir! Dir-se-ia que tivesse saído de um palco ou de um filme.
Para começar, não tinha mais de metro e meio de altura, em minha opinião — um
homenzinho gordo, esquisito, bastante velho, com um bigode enorme e a cabeça
feito um ovo. O protótipo do cabeleireiro das peças cômicas!
E conclui com desdém:
E esse era o
homem que ia descobrir o assassino da senhora Leidner!
E, mais adiante, ainda demonstra desprezo pelo inglês com erros de
Poirot:
— Não está
tudo evidente e à tona dágua, não? — perguntou o homenzinho na ponta da mesa.
Ora, nem sequer sabia falar direito!
Poirot até chaga a dar uma exageradinha
em seus modos estrangeiros e carrega ainda mais seu sotaque quando precisa que
os outros o desprezem mais e fiquem ainda mais descuidados. Ah, mas tolas,
muito tolas são as pessoas que minimizam a aguçada mente do detetive!
B) Fingir ser presunçoso
Também
eu me ponho a me gabar! Um inglês diz muitas vezes, "Um sujeito que pensa
tanto de si mesmo não pode valer muito. ... E assim, veja você, eu faço com que
as pessoas baixem a guarda. (Poirot em Tragédia em Três Atos)
David Suchet como Hercule Poirot |
Quem diria! Um dos atributos pelos quais o famoso detetive é
conhecido – sua completa falta de modéstia – não é de todo genuíno. Quero dizer
que Poirot possui inteira consciência de seus modos presunçosos, e, mais do que
isso: ele faz uso dessa presunção toda como uma técnica para despistar os
outros, ou mais propriamente, os ingleses tolos. Assim, as pessoas não lhe dão
muita importância, baixam a guarda e, de modo semelhante ao que ocorre com a
técnica de fingir que fala mal o inglês, elas acabam por fornecer pistas
relevantes para alimentarem as células cinzentas.
É o que ocorre em A
Aventura do Pudim de Natal, quando Poirot descreve a si mesmo em alta conta
com a maior naturalidade, inclusive concluindo que ninguém duvida ser ele um detetive famoso:
E, com um pequenino arranjo, eu também sou
convidado para o Natal. A tal jovem supostamente acaba de sair do hospital. Ao
chegar aqui, está bem melhor. Mas depois chega a notícia de que eu viria
também, um detetive — um detetive famoso.
Na mesma hora ela tem uma recaída. Esconde o rubi no primeiro lugar que lhe vem
à mente
Mas,
aqui entre nós, não é bem que Poirot não seja presunçoso e apenas finja que é.
Sabemos muito bem que nosso querido detetive tem a si mesmo em altíssima conta,
e, sim, se considera o maior detetive de mundo. Porem, sua inteligência é tanta
que ele também tem total consciência disso – e simplesmente utiliza sua própria
característica em seu favor. Genial!
2- Para
obter informações das pessoas:
A) Contar
mentirinhas
A longo
prazo, através de uma mentira ou através da verdade, as pessoas acabam por se
trair. (Poirot em Depois do
Funeral)
Peter Ustinov como Hercule Poirot |
Em
outras ocasiões, ainda, Poirot mente, com poucos pudores. Seu objetivo é
alcançar a verdade, os fatos, as pistas tão preciosas para que possa movimentar
as engrenagens de suas células cinzentas. E, se uma mentirinha aqui, outra ali,
ou um pequeno engodo qualquer forem necessários para alcançar seu objetivo, tudo bem.
É
o que ocorre, por exemplo, em Os Quatro
Grandes, quando Hastings declara:
Às vezes, Poirot emprega
uma maneira de falar tão peculiar, que é praticamente impossível saber se ele
está brincando ou se está falando sério.
Poirot,
depois de tantos anos, contou para o amigo que possuía um irmão, chamado
Achille Poirot, o qual teria nascido no mesmo dia que ele. Gêmeos! – exclamou
Hastings, para então descobrir que Poirot havia simplesmente inventado tal
irmão.
Outro exemplo, é o que acontece em Poirot perde uma cliente:
A enfermeira
Carruthers era uma mulher de meia-idade, de
aspecto
sério, diante da qual Poirot apresentou-se em novo papel,
e com outro
parente fictício. Queria uma enfermeira para tratar da
mãe
velhinha...
O detetive inventa que tem uma mãe idosa, a qual precisa
de uma enfermeira como acompanhante, com o propósito de investigar algumas
enfermeiras sem levantar suspeitas.
B) Envolver
as pessoas para que falem naturalmente
David Suchet como Hercule Poirot |
Já sabemos que o que pode melhor alimentar as células cinzentas são informações. Fidedignas, é claro. Mas as pessoas em geral ou temem falar com os investigadores, ainda que sejam inocentes, ou simplesmente não gostam de falar sobre qualquer coisa pessoal com estranhos. E Poirot se encaixa nos dois casos: é um detetive e é uma pessoa estranha – em todos os sentidos, diga-se.
Porém, Poirot usa de suas habilidades para conseguir que as pessoas, mesmo aquelas que acabaram de lhe conhecer, falem. E falem tudo o que ele deseja saber. Com profundo conhecimento da natureza humana, Poirot percebe em pouco tempo como envolver a pessoa, nota alguma fraqueza sua, alguma forma de lhe atingir com sutileza, de ganhar-lhe a confiança para que baixe suas guardas e revele os fatos livremente.
É o que ocorre em O Assassinato de Roger Ackroyd, quando Caroline se deixa envolver por Poirot, contando-lhe tudo que desejava saber, e é criticada por isso:
– Constitui um grande
alívio ter alguém a quem contar os próprios desgostos.
- É possível - observei.
- Com a condição, porém, de fazê-lo espontaneamente. Agora deixar que nos
arranquem confidências é outra questão.
David Suchet como Hercule Poirot |
No outro dia, Miss Ackroyd, quando estávamos sentados em torno da mesa, supliquei-lhe que fosse franca comigo. O que não se quer dizer ao papá Poirot, ele acabará por descobrir. (O Assassinato de Roger Ackroyd)
Em outras, sabe como fazer as perguntas certas ou os comentários certeiros. Ou simplesmente demonstra empatia e compreensão, incentivando a pessoa a falar, ainda que na verdade, não concorde com absolutamente nada!
É o que ocorre em Poirot perde uma cliente, quando a Srª Lawson falava de um fantasma que havia se materializado em sua frente e Poirot, que não acredita em fantasmas de jeito nenhum, simplesmente concordava amigavelmente com tudo que a mulher lhe contava:
Naquela última noite,
registraram-se fenômenos bem nítidos. Na
verdade, iniciou-se uma
materialização. Ectoplasma... Sabe,
talvez, o que seja
ectoplasma?
— Sim, sim. Conheço sua
natureza.
— Como o senhor sabe,
sai como uma fita da boca do
médium, e assume uma
forma. Agora estou convencida, Sr. Poirot,
que a Srta. Arundell era
médium, embora não o soubesse.
Naquela noite, vi
perfeitamente a querida Srta. Arundell deixar
sair pela boca uma fita
luminosa, que em pouco tempo formou
uma auréola sobre a sua
cabeça.
— Interessantíssimo!
SERÁ QUE OS MEIOS JUSTIFICAM OS FINS ?
Para Hercule Poirot, a resposta é: Sim!
Seu objetivo maior era descobrir a verdade. Acreditava que através dela a justiça seria feita: o mistério seria desvendado, o crime solucionado, o culpado condenado e a vitima poderia descansar em paz. Enfim: a ordem seria restituída e a vida voltaria à normalidade. E as mentitinhas, falsetas, pequenos artifícios para enganar as pessoas, seriam ou esquecidos, ou aclamados como genialidade de um detetive muito esperto!
Parabéns sempre acompanho suas publicações e gosto muito delas ...
ResponderExcluirTem como eu ser notificada qd vc posta algo novo? Claudiagdeassuncao@gmail.com
Obrigada, Cláudia! Fico feliz que acompanhe as publicações. Na página inicial da blogazine (na coluna à direita) há 2 opções: uma intitulada FOLLOW BY EMAIL, que é para a pessoa seguir as publicações por e-mail, e outra logo abaixo, intitulada INSCREVA-SE, para também se inscrever e receber notificações de postagens e de comentários.
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